20 de março de 2019

A Momo e o Flautista de Hamelin



Muitos conhecem o conto de fadas do Flautista de Hamelin, reescrito por diversas vezes, inclusive pelos Irmãos Grimm.

Resumidamente é uma cidade infestada de ratos, que alimentam-se dos estoques de comida nos armazéns e um prefeito gordo faz uma promessa de recompensa prometendo uma moeda de ouro para cada cabeça de rato. Aparece um flautista misterioso com roupas coloridas que toca uma flauta e leva todos os ratos para um rio, onde são afogados. Os cidadãos fazem uma grande festa mas esquecem do flautista, que retorna e pede a recompensa. O prefeito utiliza-se de uma artimanha e diz que o flautista não apresentou as cabeças dos ratos e por isso não recebera pagamento algum. O flautista vingativo, começa a tocar outra canção encantadora que passa a atrair todas as crianças da cidade, os adultos trancam-se na igreja. As crianças encantadas seguem o flautista para uma caverna distante onde são trancadas para sempre e nunca mais retornam. A cidade fica silenciosa e triste, com os armazéns repletos de comida e ouro guardados. Dizem que até hoje não há ratos na cidade, que inclusive foi um dos lugares intocados pela Peste Negra transmitida pela pulga dos roedores.

A história baseia-se em fatos reais, quando em 1284 na Alemanha Medieval (Saxônia) na cidade de Hamelin, diversas descrições histórias relatam o desaparecimento de 130 crianças da cidade. Ainda hoje, há inscrições nas paredes das ruas, nos vitrais das igrejas e uma rua onde não se pode dançar nem tocar música, chamada Bungelosenstrasse (Rua sem Tambores).

Há diversas teorias que tentam explicar o mistério que levou as 130 crianças embora para sempre... dizem que foi uma arregimentação dos cristãos para lutarem nas cruzadas, ou que foram vendidas para colonizarem a Romênia, já que a cidade estava em crise de alimentos e não poderia sustentar tantas bocas, há teorias de pedófilos ou serial killers que as levaram para as florestas vizinhas e ainda teorias conspirativas de abdução por alienígenas... Não há conclusões exatas do que houve de fato, no entanto as 130 crianças realmente desapareceram, mas obviamente o flautista é uma alegoria criada ao longo dos anos para representar algo mais profundo.

O fato deu origem a lenda, a história perpetuou-se no imaginário coletivo devido ao grande impacto em nossa psiquê profunda, assustando-nos sobre a possibilidade real de nossas crianças irem embora, significando a perda da perspectiva do futuro, ou a interrupção de nossa linhagem e perda da fertilidade natural.

Analisando os arquétipos das figuras, a cidade e o prefeito representam o indivíduo carregado de culpas e frustrações, que seriam os ratos... O indivíduo faz promessas e apela para meios artificiais e mágicos para livrar-se dos problemas, mas logo a mágica volta-se contra o aprendiz de feiticeiro passando a comprometer seu futuro, levando embora as perspectivas de continuidade e seus bens mais preciosos.

Tenho percebido diversos desenhos infantis, a temática do roubo de ovos, no caso dos Porcos dos Angry Birds, em um episódio da Era do Gelo (especial de Páscoa), Como Treinar seu Dragáo, Turma da Mônica, enfim...

Paralelo a isso, nossos hábitos modernos, fazem com que haja uma real diminuição da fertilidade da terra necessitando cada vez mais de químicos para que as sementes germinem e isso associa-se à queda da taxa de fertilidade humana e animal, devido ao bisfenol A (BPA), dioxina, atrazina e vários ftalatos (BBP, DEHP, DOP e DBP), presentes em quase todos os produtos que utilizamos em nosso dia a dia, com "clara evidência de perturbação da atividade endócrina, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). É comum conhecer um ou mais casais em clínicas de fertilidade tentando engravidar de todas as maneiras possíveis. Nosso futuro roubado!

Agora aparece a Momo, escultura japonesa de Keisuke Aiso, assustadora e terrível que aparece em vídeos infantis do Youtube e redes sociais, transformada num jogo macabro que desafia as crianças a suicidarem-se sem contarem nada para os pais ou as consequências serão ainda piores, ao fundo uma música hipnótica. Assisti alguns vídeos, são terríveis! Impossível não associar com a Baleia Azul!

O flautista de Hamelin reaparece na cidade tocando uma canção assustadora para raptar nossos filhos novamente, agora a doce flauta aparece em sua mão num formato retangular que emite luz, parecendo ser um celular atraente!

Alerta geral!!!! Reuniões nas escolas! Pais, bloqueiem o Youtube! Desinstalem o Whatsapp! Arranquem os tablets das crianças!!! Convocam-se autoridades!! O Ministério Público exige explicações!! Diretoras das escolas, tranquem os celulares nas gavetas!!! Mas a música do flautista segue infiltrando-se pelas frestas da sociedade, melodiosa e hipnótica como no passado, alguns pais fogem para as igrejas para rezarem e todos conversam sussurrando e apavorados pelos corredores, perguntando: - O que está acontecendo nesse mundo?? Quem é capaz de criar esse absurdo??

Também me encontro assustado, tomando todas as medidas recomendadas e refletindo sobre o que fazer, mas o fato é que outras Momos de Hamelin virão, em outros formatos de mídia, mensagens subliminares, roupagens coloridas, sussurros melosos e tentadores, jogos de desafios destrutivos, convocações aos atentados, misteriosos acordos e pactos sedutores... ninguém sabe, de onde vem e onde acaba, qual a próxima onda.

Esqueci de dizer que na história original, três crianças não seguem o flautista, uma cega, que se perde no caminho e retorna, um menino de muletas que, sendo lento, não acompanha a turba e um surdo, imune à melodia mágica, permanece em sua casa.

Obviamente o flautista, a Baleia, a Momo, pedófilos, drogas... são os vilões da história, repito, são os vilões da história, não tenhamos dúvidas, mas quantos de nós, pais, temos agido da mesma maneira que o Prefeito da Cidade, que carregado de tarefas, pequenos vícios, alegando falta de tempo, temos abdicado de nosso papel primordial de educar e acompanhar nossos filhos... Como os cidadãos adultos de Hamelin, temos acumulado problemas e realizado falsas promessas para nós mesmos, temos exigido de nossos filhos, comportamentos em que não somos exemplos... O pai se pergunta: - Quem raptou meu filho? Mas pare e pense, antes esse filho deve ter se perguntado: - Quem raptou os meus pais? Não existe espaço vazio, alguém substituirá nossa presença.

Sei que nosso tempo é curto e passamos mais tempo no trânsito que com nossos filhos, que o trabalho nos ocupa, que o patrão nos enche o saco, que a casa ta uma zona, e minha vida e minha conta no banco é uma bagunça, isso sem falar nos pais que também estão viciados em outras drogas e ausentam-se ou violentam seus filhos. Mas essas Momos aparecem como algo que nos faz parar tudo e refletir sobre o que temos sido e qual o reflexo disso na personalidade de nossos filhos.

O fato da criança surda ser imune à canção, para mim é o mais significativo, claro que não adiante tapar os ouvidos nem cegar as crianças. Há que preencher esses sentidos com muito diálogo e carinho, educando-os para que não cedam à sedução misteriosa ou ao medo de ameaças alheias, tendo em sua família os soldados de primeira linha, pois confia no exemplo e nas conversas com os pais, as pessoas que mais confiam e que tem o dever se conversar e explicar todos os assuntos desse mundo, sem tabus ou terceirização da educação para a internet, onde não importa o rosa ou o azul, príncipes ou princesas, há que colocar-se ao nível das crianças mas sendo real e objetivo.

Para que entendam as ameaças concretas contidas nas entrelinhas dos estranhos sedutores, que denunciem as violências, conversem sobre abusos, defendam-se da agressão e bullying, entendam sobre sexualidade, respeitem o diferente e principalmente que brinquem e dialoguem com a família.

Repletas de boas experiências e de laços familiares e comunitários, serão surdas para qualquer tipo de violência, mas com bons ouvidos para a realidade, para as conversas e o carinho de seus pais.  



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